segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Safo

Quem disse que numa história entre duas mulheres ambas têm de se chamar Érica e Maria Ângela, nomes aspas normais, têm de viver em São Paulo ou qualquer outro lugar não muito longe de onde moramos, e têm de se amar exatamente quando você lê? Mulheres sempre se amaram. Adolescentes maias sentiam a ponta da língua na língua da outra, duas jovens nobres de algum império na África em meados do século XIV (que importa se Mossi ou Ashant?) beijavam-se os bicos dos seios com suave sucção, jovens solteiras do Taiti corriam nuas pela praia, a duas, a três, mais
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E eu imagino ou tenho certeza que existiram duas jovens. Digamos que uma se chamasse Helena. E que a outra fosse Melissa. E que Helena tivesse os quadris largos, troféu de feminilidade. E que Melissa possuísse os lábios grossos herança de sua avó, escrava da Núbia. Com esses nomes elas tinham de viver num lugar em que os homens falam demais, digamos, a Grécia. Não a de hoje, a de filósofos chatos que todo mundo cita. Digamos, perto da Ágora. Os homens falavam, planejavam facadas em guerras, as mulheres se amavam.
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Digamos que se conheceram nas Termas – duzentas, cem mulheres a se banharem nuas, a conversarem nuas, a se tocarem nuas. E digamos que o joelho de Melissa tenha tocado o interior da coxa de Helena e o corpo e o coração de Melissa tenham dito, É esta.
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E o primeiro beijo se deu na casa de Helena, seu pai um sisudo senador, lá longe, enquanto as mãos da filha pousavam nos bicos da amiga enquanto esta lhe amassava a língua com a própria. E Helena decidiu sacrificar sua virgindade como suprema homenagem à amada. Deitou-se em almofadas de delicado tecido da Cítia, afastou as coxas o mais que pôde a mostrar delicado caminho rosado do amor, caminho este que pela primeira vez foi percorrido pelo esguio dedo médio de Melissa, não sem antes dar dúzias de beijos no portal de pelos louros da amiga, que expressou a paixão em doze gritos muito finos. E os dedos de Melissa se retiraram cobertos com a cor rubra do amor feito pela vez primeira. E Helena e Melissa se escreviam poemas, se prometiam amores eternos e declaravam ser uma da outra. E se amavam, próximas ao portal da janela, a se jurarem amor no êxtase.
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E um dia a sobrinha de Helena tudo viu. E cresceu, e crescida, Safo se dedicou a viver e criar histórias de amor entre as mulheres, como esta.

3 comentários:

  1. Excelente abordagem...Continua

    http://www.sexoa2.blogspot.com/

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  2. Helena's e Melissa's continuam a inspirar muitas Safo's, e estas àquelas. E, a sociedade continua, à boa maneira antiga, a ostracizar quem prazer delas tira.

    A ilha de Lesbos é considerada um “ícone geográfico” pois, representa a pureza e libertação interior inata nas mulheres; o amor…, que poderia ser mais extensivo se fossem compreendidas.

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  3. A guerra é dos homens. O amor é das mulheres, a beleza, o perfume, a delicadeza. Uma mulher amada. Que prazer melhor para um homem?

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Seus comentários! Beijos, Beatriz.