segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Queridas e queridos,

Por estes meses foi um prazer escrever aqui para vocês. Era uma alegria ver o índice de visitantes aumentando nas segundas e nas terças, e principalmente ver os comentários. Gosto de imaginar que proporcionei momentos de alegria às pessoas, prazer a dois, a um, a três, a trinta eheh.

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Tudo na vida muda, e neste momento estou enforcadíssima com mudança de emprego. Quem me acompanha sabe que prometo pouco para poder cumprir sempre. E não poderei ter o prazer de continuar com esse blogue até abril de 2011. Então voltarei, talvez neste mesmo formato, talvez não.

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Agradeço a toooodos os que comentaram, e a todos os que leram. Amem muito, sejam felizes, e eu respondo a e-mails sim. Deixo vocês com o primeiro capítulo do meu livro, a coisa mais real que escrevi. Sejam felizes, amem muito sempre com camisinha, e 2011 está logo aí! Eheh


Beijos e beijos,


Beatriz


A PROPOSTA DE LUDWIG (Como tudo começou)


Nunca pensei em ser dondoca.


Sempre vi o trabalho como algo natural. Filha de contador, filha de professora, o ciclo formatura / carteira de trabalho / vestido de noiva / aniversário de filho era para mim inevitável como respirar. Meus irmãos escolheram megabytes ou índices de liquidez corrente. Eu escolhi Machado e Graciliano. E pensei desse jeito até um mês de dezembro. Então começou minha aventura, que você vive a partir de agora.


Faltavam vinte e dois dias para minha formatura quando saí pelo portão principal da Universidade. Estava atrapalhada por dois Dom Casmurro de exemplares grossos que tinha emprestado na biblioteca do Instituto de Humanas. E mais três Os Bruzundangas, e mais um Bom Crioulo. O Colégio C... estava com um programa de ensino de literatura em pequenos grupos. Eu entusiasmada com meu estágio lá.


Carregada de realismo e naturalismo mal percebi o carro com velocidade de tartaruga. Seguiu-me desde a esquina da Pedro Gerheim até um par de ruas depois. Não dei importância.


E nem o percebia no dia seguinte. Meninos de dezesseis podem ser apaixonados por Machado mas são mais ainda por carros. Discutíamos na frente do colégio se Capitu traiu e um dos rapazes apontou o Mercedes prateadinho. O setor masculino o reverenciou como manifestação do Olimpo, as meninas torceram o nariz. O motorista pareceu intimidado. Arrancou, evitou passar em frente a nós, vidros levantados.


Encontrei-o parado na direção da favelinha onde dava aulas de pré-vestibular como voluntária, meia dúzia de horas depois. Não se moveu.


Dia seguinte mandei um de meus alunos como espião e ele informou que lá estava o alvo, como chamou. Dispensei a turma dez minutos mais cedo. Plano feito. Saí pela entrada lateral, dobrei a esquina e lá estava, porta aberta, sem ninguém, em frente a uma birosca.


Gente há que acredita em sorte. Eu creio em intuição. Intuí que eu não estava ameaçada. Se alguém ameaçava, era eu. Mineiros são loucos por branquinha. E o dono da birosca era daqueles chatos, mostrava o litro e insistia e insistia. O comprador ou vítima dizia não obrigado com um português atolado. Quis sair, deu de cara comigo e minha vida nunca mais foi a mesma.


Era um palmo mais alto que eu. Os olhos azuis e a cabeça comprida me bateram na hora: estrangeiro. Jeans e camiseta que nele tinham a elegância de smocking. Olhos de menino pego roubando o doce de goiaba. Por um par de segundos olhamos um a cara do outro. Ofereceu-me a mão com a naturalidade de quem se apresenta à Rainha. Disse: Ludwig! Ri.


- Na Faculdade, no colégio, no voluntariado. Está me seguindo?


Afagou coceira imaginária na nuca. Não conseguia me sustentar o olhar.


- Sim – disse ele.


- Por quê?


- Que tal se disser que acho você bonita?


(Apelando para minha vaidade! Devia se envergonhar!)


- Vai comprar a branquinha do homem?


Duas notas pequenininhas trocaram de mãos e Ludwig arremessou o litro numa lixeira dois passos depois. Trocamos oficialmente de nome e telefone. Recusei a oferta de carona. Agradei ao recusar, gostou de minha cautela.

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Todo namoro é um ritual. Bares na subida da São Mateus, Chopin e Beethoven no Cine-Theatro Central, caminhadas ao mirante do Morro do Imperador. E as apresentações às famílias ou melhor à minha, pois a de Ludwig está a uns oito ou nove mil quilômetros de distância. Nasceu em Hannover há quarenta anos, há quase dezenove veio para cá e não quis mais sair. Dirige a fábrica com mão suave. Apaixonado por polias e voltagens, ao voltar do trabalho esquece as máquinas, uma das coisas que me fascina nele.


Nosso primeiro beijo foi três dias depois de começarmos a namorar. E um par de semanas depois sua mão deslizou pelo meu ombro, seguiu a curva, escolheu o caminho por baixo do top verde-enjôo, parou sobre o bico e deu um par de voltinhas. Aos catorze anos eu já decidira que os sutiãs eram um trambolho desnecessário e a mão dele se aproveitou de tal decisão. Não me incomodei nem um pouquinho-quinho.


Semanas seguintes tops e microblusas também se foram revelando demais. Na verdade só uma tanguinha cor-de-rosa com duas inevitáveis estampas de coração me separavam da roupa de Eva quando ele pronunciou a palavra casamento.


Senti a pancada. Nunca pensara. Era como uma roupa cujo manequim não cabe, você não compra e não pensa sobre.


Perguntei se queria toda a verdade. Se queria casar comigo, que fosse sem zonas de sombra. Ele disse Sim. Revelei dois namoricos da pesada. Contei de uma menina de dezoito num motel com o estúpido nome de Styllus a olhar mais curiosa que excitada o falo muito duro do coleguinha de Lingüística Românica. E que essa foi a primeira de quatro com o primeiro namoradinho, e depois teve mais cinco com o segundo, cada uma revelada com detalhes de radiografia. Falei de calcinhas sendo tiradas em bancos de fuscas, de laços de calções masculinos sendo desfeitos com os dentes.


Calei. Esperei a tríade vagabunda-cadela-vadia seguida da partida-para-nunca-mais. Por um par de milênios não abriu a boca. Mas abriu. E disse:


- Na terceira transa com o primeiro namorado, afinal você chupou ou não o rapaz?


Minha vez de abrir a boca, de espanto. Num pedaço de segundo repassei tudo e lembrei que esquecera aquele detalhe. Ludwig me ouvira como um aluno de declinações do latim. Derramei o balde, verdade em excesso:


- Chupei e muito. Não era pequeno.


É agora, pensei. Tinha sido noiva por trinta e sete minutos.


A tríade não veio. A mão tremida engatou a marcha. Deixou-me em casa. Deu a volta para abrir-me a porta, cavalheiro. Eu me roía por ter feito sofrer uma pessoa a quem queria bem. Para me castigar, encarei-o. Caí o queixo. Não vi sofrimento. Não havia sofrimento.


Havia felicidade.

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Pensei que a espera seria pelo restante dos séculos. Mas foram só três dias. Ludwig me ligou. Tinha uma surpresa, voz ansiosa de vestibulando devorando lista de aprovados.



A surpresa era uma caixinha. Abriu-a, duas alianças dentro. Meu lado Cinderela deu um pulo. Já nele não havia euforia, havia ansiedade como se o vestibulando agora chegasse às últimas vagas sem ver seu nome. Ele disse que agora era a vez dele ser sincero.


Começou: amava-me, queria igreja, véu, grinalda, e que eu fosse fiel.


- Serei – disse eu. – Nunca terei outro.


Engasgou, tossiu, disse que não era bem aquilo. Ou melhor, era sim, mas. O conceito dele de fidelidade era: eu sempre faria amor com ele, só com ele... e engasgou de novo, ...mas o corpo poderá ser de outro homem.


Demorei uns cinco segundos para juntar os pedaços.


- Você quer que eu faça amor com outros homens?


- Não, não. Comigo.


Relaxei.


- Mas através do corpo de outros homens.


Tensionei de novo. Detalhou: Não precisa ser na minha frente. Pode ser longe de mim, desde que me conte tudo. E não precisa ser com outro homem. Podem ser mulheres, ou casais. E quem vai fazer amor seremos nós dois. Fidelidade total. Não dê importância aos outros homens ou seja lá quem. São corpos que utilizaremos para o nosso prazer. Mas amor, só entre nós.


Popó e Maguila me acertaram juntos na cara. E Ludwig ainda tinha um segundo pedido. Ele sabia o quanto eu gostava de ensinar. Disse que eu poderia pegar algum trabalho voluntário. Mas ele ganhava o suficiente mesmo que fôssemos duzentos, quanto mais dois. Eu dedicaria meus dias às compras e ao amor. Essa seria a minha vida com ele.


Teria aplicado um tapa de mão cheia em qualquer pessoa do Planeta Terra que não ele. Naquele momento eu descobri que amava Ludwig. Saí em silêncio.

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Tentei voltar à minha vida. Colégio, voluntariado, família, leitura de Drummond, planos de mestrado. Evitava olhar as fotos de formatura. Lá estava Ludwig, feliz, nós felizes, eu com a ridícula beca de babador.


Ele era uma página em minha vida que eu tentava virar mas parecia colada. Particularmente tentava virar a página da proposta. Repetia a palavra absurdo. Absurdo, absurdo. Como ele podia me fazer uma proposta absurda daquelas?


Bronzeado de surfista, músculos de astro do Big Brother, o garotão pediu meio balde de morango com chocolate na sorveteria na Rio Branco. Uns dezenove anos, por aí. Eu a duas mesas de distância, delirei. Marido permissivo, chave do Vectra na mão, eu passaria um plá, o levaria para casa, em frente à sagrada cama de casal eu faria cair esse jeans e o resto, só uma coisa se ergueria, muito rígida, e meu marido aparecendo de surpresa, pasta na mão, rindo a viver. Absurdo... era isso que Ludwig queria? O garotão saiu e no mesmo lugar veio uma loura. Jeitão de separada e era separada mesmo, ouvi-a recitar ao celular, “meu ex-marido”. Óculos escuros, pediu só sabores diet. Delirei de novo. O garotão ao lado da cama desapareceu e se transformou nela, cabelo solto, óculos jogados de lado, abrindo a blusa como stripper me revelando a inexistência de sutiã. Nós duas. E o garotão se rematerializou e abraçou a nós duas. Nós três. Engasguei do milk-shake de baunilha com adoçante.


Decidi que era fantasia e que fantasia não paga pedágio. Delirava em tudo. Em casamentos me imaginava acordando abraçada de recheio aos corpos nus da noiva e do noivo. Imaginava amigas com olhos em faíscas me convidando a uma lua-de-mel de fim de semana com o marido, ou com elas mesmas. De absurda a proposta foi passando a estranha, de estranha a incômoda, depois só meio isso.


Recebi rosas cor-de-paixão e um bilhete perfumado: “Amo-a”. Devolvi o bilhete com uma palavra rabiscada ao lado: “Também.”


Casamo-nos numa igreja de formato estranho em Juiz de Fora.


4 comentários:

  1. Caríssimos Beatriz e Ludwig (me dirijo a ambos, porque estou certo das contribuições de Ludwig para estes relatos):

    Foi com tristeza que li sobre o fim deste blog.

    Sempre muito bem escrito, tocava absurdamente nas minhas mais íntimas fantasias, fetiches e taras.

    Gostaria muito de poder conversar com vocês em algum momento. Vou deixar aqui o meu contato de msn e e-mail: casalcp2009@hotmail.com
    Adoraria receber notícias suas. Isso aqui vai deixar saudades.

    Achei um fragmento de um poema que se chama "Tudo vai acabar". Lembrei de você e resolvi deixar registrado aqui.

    Beijos e muito boa sorte ao casal.

    SR.EROS (Casal Eros & Psiquê Minas)

    "Imponha-se diante dos espelhos
    Olhe seus olhos, agora negros.
    Você ainda está lá!
    Olhe bem fundo,
    Entenda o desespero,
    Corra.
    Tudo vai acabar!


    Tua pele arrepia,
    Não sabes onde pisa,
    Algo te impede de respirar.
    Você quer sair,
    Você quer parar,
    Está cansada.
    Tudo vai acabar!


    Teme a morte,
    Venera à Deus,
    Acredita em milagres.
    Alma pecadora,
    Tu sabes teus pecados
    Ainda tem contas á pagar.
    Tudo vai acabar!


    Ta te sufocando,
    Coloque pra fora.
    Sai dai,
    Ainda pode se salvar.
    As costas envergam agora,
    O frio te arrebate as pálpebras
    As pernas não sustentam as costas.
    Tudo vai acabar!


    Dói,
    Não desista,
    Abra seus olhos,
    Logo encontrará a saída.
    Tudo vai acabar.


    Termine,
    Você pode terminar!
    Você queria que terminasse,
    Vá em frente, acabe com tudo.
    Esqueça do medo,
    Hoje poderás ousar!
    Tudo vai acabar!"

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  2. Recolocando mensagem apagada pelo blogger:

    EROS,
    você foi um refrigério durante esses meses. E a vida muda, não pára! Estamos sempre aqui e voltaremos, pois somos seres eróticos (todos nós) desde a primeira hora de vida. beijos, sejamos felizes e até breve! Continuemos sempre no erotismo!
    .
    Beijos e beijos,
    Ana Beatriz (e Ludwig)

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  3. Veja o nosso blog
    http://casal-oeste-10.blogspot.com/?zx=a6fc9239eb44a1fc

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  4. Gotei de todos os seus contos, parabéns!Pena que esteja parada nas suas edições.

    Como não tem e-mail para lhe poder comunicar que editei no meu blog o seu primeiro conto "CINDERELA", faço-o aqui.

    Se achar que o deva retirar, diga-me por favor.

    Uma vez mais, parabéns pelo bom gosto de sensualidade e erotismo impregnados nos seus contos.

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Seus comentários! Beijos, Beatriz.